O estabelecimento comercial é um dos temas que mais despertam o interesse dos empresários e sociedades empresárias, o que é explicado pelo próprio conceito de estabelecimento comercial.
O Código Civil conceitua o estabelecimento comercial no seu artigo 1.142 como “todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa”. Esse complexo de bens é composto pelos bens materiais e imateriais para o exercício da atividade empresarial.
Os bens MATERIAIS podem ser dinheiro; mercadorias, móveis, imóveis, dentre outros; ao passo que os bens IMATERIAIS podem ser a propriedade industrial, literária e artística, bem como as marcas e patentes.
Daí o grande interesse dos empresários e das sociedades empresárias sobre o tema, já que o estabelecimento comercial representa uma universalidade de fato, sendo o OBJETO de direitos e de negócios jurídicos, como se infere do artigo 1.143 do Código Civil.
Feitas as considerações iniciais, passa-se a descrições sobre os pontos de dúvidas mais relevantes no tocante ao estabelecimento comercial.
1 CONSIDERALÇÕES SOBRE A ALIENAÇÃO DO ESTABELECIMENTO
São extremamente necessárias ponderações sobre a formalidade dos negócios jurídicos envolvendo o estabelecimento empresarial, haja vista que a sua inobservância poderá causar prejuízos diversos às partes envolvidas.
1.1 NECESSÁRIA AVERBAÇÃO E PUBLICAÇÃO DO NEGÓCIO
O primeiro ponto a ser considerado é a necessidade de AVERBAÇÃO DA TRANSAÇÃO NO REGISTRO DE EMPRESAS MERCANTIS. Como determina o artigo 1.144 do Código Civil, o negócio jurídico “só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado” no Registro Público de Empresas Mercantis.
Art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial.
Mas não é só. A publicação do negócio jurídico na imprensa oficial também será condição de eficácia do mesmo perante terceiros.
1.2 A ALIENAÇÃO NÃO PODERÁ REDUZIR O ALIENANTE À INSOLVÊNCIA
O segundo ponto que merece destaque sobre os negócios jurídicos envolvendo o estabelecimento é o fato de que a sua alienação não poderá reduzir o alienante a insolvência. Em outras palavras, aquele que vende o estabelecimento comercial deverá possuir patrimônio suficiente para saldar seus débitos eventualmente existentes.
Art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação.
Manter meios suficientes para saldar as dívidas é condição de eficácia do negócio jurídico, logo, caso o alienante quite todos os débitos que possuir, essa condição não afetará a eficácia do negócio.
Outra forma de manter a eficácia do negócio, mesmo mediante a existência de passivo maior que os ativos do alienante, é o consentimento dos credores com a alienação do estabelecimento – consentimento que poderá ser tácito.
A demonstração da condição financeira do alienante pode ser demonstrada no negócio jurídico, anexando-se a documentação necessária à sua comprovação, como forma de proteção aos interesses do adquirente. Aliás, a cautela recomenda tal medida.
1.3 RESPONSABILIDADE SOBRE OS PASSIVOS DO ESTABELECIMENTO
O ADQUIRENTE do estabelecimento, em regra, responderá pelo pagamento de todos os débitos, mesmo que anteriores à realização do negócio jurídico. Necessário, no entanto, que tais débitos estejam regularmente contabilizados.
Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.
Outra característica importante da venda do estabelecimento é que o alienante responderá solidariamente pelas dívidas contraídas antes do negócio jurídico respeitados o prazo de um ano a contar do seguinte modo: a) A PARTIR DA PUBLICAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO – para os débitos vencidos; b) DA DATA DO VENCIMENTO para os débitos que foram contraídos antes do negócio jurídico, mas que não estavam vencidos.
É possível que o negócio jurídico estabeleça de maneira diversa essa responsabilidade sobre os débitos – como a responsabilização exclusiva do ALIENANTE, por exemplo – contudo, imperiosa se fará a aceitação expressa dos credores.
De toda forma, a cláusula que disponha sobre a distribuição da responsabilidade das partes sobre os débitos NÃO TERÁ VALIDADE CONTRA TERCEIROS no tocante aos débitos tributários e trabalhistas!
A cláusula continuará a valer entre as partes, entretanto. O ADQUIRENTE responderá SUBSIDIARIAMENTE pelos débitos tributários e trabalhistas, caso em que poderá se valer da ação de regresso contra o ALIENANTE.
1.4 ALIENAÇÃO DO ESTABELECIMENTO E O DIREITO DO TRABALHO
A mudança de propriedade do estabelecimento comercial, a princípio, não afetará os contratos de trabalho dos seus empregados. Nesse sentido, o artigo 10 da Consolidação das Leis do Trabalho é expresso sobre o tema.
Art. 10 – Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.
Portanto, as relações trabalhistas dos empregados serão transferidas ao comprador tão logo seja efetuada a venda do estabelecimento empresarial, salvo estipulação em sentido contrário. Isso não quer dizer que o alienante ou o sócio retirante (aquele que sai do contrato social com a venda da sua quota) estará totalmente livre de quaisquer responsabilidades trabalhistas.
Quando restar comprovada que a venda ou retirada do sócio decorreu de fraude na alteração societária, este – o sócio retirante ou o alienante – responderá solidariamente com os demais pelos créditos trabalhistas.
Art. 10-A. O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, observada a seguinte ordem de preferência: (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
I – a empresa devedora; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
II – os sócios atuais; e (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
III – os sócios retirantes. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
Parágrafo único. O sócio retirante responderá solidariamente com os demais quando ficar comprovada fraude na alteração societária decorrente da modificação do contrato. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
O alienante ou sócio retirante, de igual maneira, responderá solidariamente pelos créditos trabalhistas referentes ao período em que figurou como sócio, desde que esses créditos trabalhistas sejam oriundos de processos ajuizados até dois anos depois de averbada a venda ou alteração do contrato social.
1.5 ALIENAÇÃO E A CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA
O Código Civil dispõe de regra que determina a proibição de o ALIENANTE do estabelecimento fazer concorrência ao ADQUIRENTE no prazo de 5 anos subsequentes à transferência. A cláusula da não concorrência é a regra legal, que terá validade caso o contrato não disponha de outra maneira sobre a possibilidade da concorrência.
Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subseqüentes à transferência.
Parágrafo único. No caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato.
As partes, no entanto, poderão estabelecer de maneira distinta sobre a regra da não concorrência, seja permitindo a concorrência ou estabelecendo prazos maiores ou menores para a não concorrência.
O parágrafo único do artigo 1.147 do Código Civil prevê que o prazo para a não concorrência deverá ser o prazo do contrato, quando o negócio jurídico se tratar de arrendamento ou usufruto do estabelecimento.
2 CONCLUSÃO
Os negócios jurídicos envolvendo o estabelecimento; seja o caso de alienação, arrendamento ou usufruto; possuem muitas peculiaridades, exigindo, quando possível, o acompanhamento de um profissional – advogado especialista em Direito Empresarial – para que garanta ao interessado a maior segurança jurídica no tocante aos direitos e obrigações assumidas.